segunda-feira, 2 de agosto de 2010

penso
não penso no senso
penso e repenso
adenso o pensamento
e nesse adensamento
um acanhamento desses
de amamento
e prostramento
e brochamento
de um bicho chupando de dentro
um catarro do chumbo da vida
cor de turvo da uva largada
mesmo turvo da pequena
extensão das coisas - seletas
brotava
um acanhamento extenso
desses acanhamentos
que mesmo que acanhado
em todo seu acanhamento
segue tropeçando
sem cuidados
no translado
atravessando engajado
a avenida "qualquer fosse o defunto"
porque no mundo
o assunto
é sempre defunto
fedendo morrendo
estuprado assassinado
envenenado genocídio
ou suicídio
ou atropelamento
ou emburrecimento
ou entristecimento
ou entretenimento de paixão ou traição
ou culpa
apodrecendo a vida
pra dar vida pros vermes sem vida
pra ser comida por pássaros
e alimentar os homens
que conheço
e não conheço
penso
não repenso o que penso
não penso no que repenso
não penso no pensamento
pensamento turvo
pensamento denso
se encolhendo
se dissolvendo se sujando
se comendo
em cima do furo
do muro
do mundo, em seu centro
de dentro pra fora
de fora pra dentro.

terça-feira, 6 de julho de 2010

a vida é mesmo linda - descoberta essa
ainda que tardia, ainda que vazia
beirando incompleta
vou assistindo
ao movimento dos meus dias
vivendo um coração que se desfaz
sobre a sinestesia infinita que é
a translação solitária do planeta
que há em mim
e o rompimento definitivo
de um amor absoluto
capaz de mudar tudo.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

deitou e dormiu como se fosse muito
tarde
não me beijou não me olhou não me comeu
deixou o tempo romper um dia a mais.
quase não cabendo no canto que ocupava
da minha cama
coçou a bunda.
ninguém coça a bunda tão sobriamente
sem estar acordado.
rolou mais meio palmo pra longe da minha lingerie
infantil
passei a mente por todas as questões moralistas
e existencialistas
de amor e tempo,
e nenhuma teoria provavelmente furada tocou
meu coração.
além de tudo, mantinha os braços fechados contra o corpo
como se não quisesse sofrer
a ação de nenhuma força maior
capaz de desviar seu corpo
do cansaço.
e tinha também que nem roncava
e na altura dos fatos
não roncar podia se tratar de uma
desconfiança.
de costas pro meu apelo
continuou partindo o silêncio
com pequenos movimentos irregulares
e uma respiração que beirando o frágil
fazia tudo continuar.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

amarelo frágil

cada separação

as páginas

a distância das ruas

da infância

a sombrinha cor de rosa

de bolinhas amarelo frágil

a moldura dos espelhos

e dos quadros

e das portas

e lençóis e fronhas

teto e guarda-roupa

e a luz entrando devagar

pelas frestas da cortina da sacada

e os livros e as coisas

e as paredes por trás das memórias

de todos os seus beijos tímidos

amarelo frágil

e eu, e as lentes do meu ray-ban.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

sem título

mais que todas as coisas
esse era um domingo comum.
e eu, como normalmente, cheio
de domingos, fiquei sem nem
mexer ou piscar
com o corpo estendido
na diagonal direita
da cama de casal
que antes era da minha mãe
feito essa gente
que vê a vida passar
e pronto.
e se fosse isso?
e não fosse aquilo?
nada daquilo?
e se não bastasse?
fosse de repente?
nada mais fizesse sentido
nem estirar o corpo
enquanto a morte ia crescendo
invadinho todas as frestas
do meu quarto.
o namorado na sala
comendo a outra metade
da comida que eu pedi.
pensando, se é que era
na morte da bezerra
ou em nada
porque embora fosse tudo
isso
resultado de um pensar incansável
e persistente e incessante
gostava mesmo
era de esvaziar a cabeça de tudo
como forma de ficar livre
um tempo
mas quando se mora no centro
em dia de clássico de futebol
se quer ir pro meio do mato
onde há o silêncio
porque o silêncio também é
coisa que ajuda a deixar
a cabeça oca
ou o contrário?
no silêncio absoluto
do absoluto
com quais idéias a gente
vive? e anda.
sei dizer não.
outro dia fiquei tentando
pensar num lugar que não
se ouvisse ruído de vida
sequer que fosse
mas até no deserto
de um deserto
a gente deve ouvir o vento.
que jeito é esse
de ser vazio?
esquecer da porta
e das frestas da porta
por onde a morte rompe
o silêncio também
e o namorado que já volta.
se todas essas coisas
simplesmente desbotassem
eu passaria por passar
assim passando
a me importar com coisas de grande importância
como as formigas.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

bic ho #versus

pela fresta

do estômago fechado

e vivo

o bicho via

por veias

urgentes

esgotadas

coléricas

amórficas

tu e tua espada

empunhada

embainhada

reluzente

com os dentes cobertos

de valentia

tu,

cavalgando

branca

a tua bicicleta

alcançando bravo

o que não há por dentro

vencendo

a escória

do excremento

avançando entre

sobras poros uretra boca tudo

tu com pé no pedal do mundo

rasgando luzes

cegando cão sarnento

lhe negando dores

esconjurando seus restos

vaiados

no fundo do escuro de dentro

dobrando

suas raízes cansadas desmaiadas

berrando até matar

vestindo tudo de cores, mais nada

despindo a tua espada

vazio do meu corpo sadio:

vazio indefeso salutar.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

bicho #1

latindo um silvo
como um uivo
rasga e arranha
roendo as entranhas
encantado
estupefato
mesquinho
abruptamente insensato
sorvendo corpinho
lambe o próprio
rabo
imundo
mija em seu lugar no mundo
o bicho
o bicho
o bicho,
vencendo
o centro
do sujo do lixo
de dentro.

sábado, 3 de abril de 2010

fixie love (para música de manuel horta)

so

(every time)

like I mean

to paint

(so bored)

a brand new

(color)

week

I take my fixie

that makes me ride

(wondering)

all buildings

beside me

mixing

into the sun

of midday

passing me by...

I split with you

those hours

to keep on being

(standing by)

the only cloud

among the skies.

domingo, 28 de março de 2010

bic ho #tal

um bicho que era
não era
já era
um bicho que berra
beirando o berro
pés limpos de barro
catando cavaco
cavando buraco
cheirando suvaco
assoviando aquelas
músicas de animações
antigas...
mais que isso
aquilo outro
(a luz cansada
a mão no bolso)
atrás do oco
sugando o poço
até o caroço
o bicho frouxo
querendo segregar
o lixo
querendo se afirmar
um novo bicho
que já não era
arrebenta
a pauta do estomâgo
latindo aos escarros
aos terrenos baldios
que nunca tomavam sol...
até de repente
pedinte de dor
o bicho atravessa
rompante
e pedante: o bicho
se eleva arrastado
a carne dobrando
calando opaca
cobrindo as penas
pequenas
com corpo
sedento cedendo às cores
fingindo de morto
e chupando manga
e rompe
e vence
e vaia
as veias das estranhas
rompidas
p'ra ainda praguejando
e implorando
se ajoelhar
no outro mundo.

terça-feira, 9 de março de 2010

visto que eu já estou

mastigando meus pedaços

pra tu me adivinhar

como se todos pedaços que falhassem

no meu corpo

fossem feitos de ti...

como se o intervalo fermento da tua e minha

saliva

se inventasse levianamente oco

pra não ser inútil, mesmo que sendo...

e visto que eu também

já estou

perdendo todas as migalhas nas curvas

da minha cama

enquanto a fome suposta a

ser famigerada de gente de mundo,

cresce de repente só tua...

sendo:

me leva pra passear

na tua bicicleta.

pega na tua mão

o tanto de vida que tu me impôs assim...

e dorme em mim aqui hoje também...

vai embora não.

terça-feira, 2 de março de 2010

fico daqui

te imaginando na tua bicicleta

branca, de aro vinte e sete

crescendo a cada esquina

até tão maior que tudo

de repente,

até tu na minha cama,

pra tu discorrer sobre idéias

que tu viu no caminho

e tomar meu coração

pra ti

como se o quisesse

e pra tu adormecer

no meu abraço

e a tua bicicleta

na minha sala de estar.

segunda-feira, 1 de março de 2010

bic ho #6

mais uma tragédia
na cabeça do bicho
de cabeça pra baixo
na árvore do córrego
no final do verão
de dois mil e dez,
suspenso e frágil em sua carcacinha
imóvel se não chegar e ventar-se
enquanto outro bicho outro
quase que menos morto
se guardava noutro tipo de tragédia
sem se enterrar se desgraçando
crescendo mesmo e devorando seus mesmos
pedaços
enquanto corroendo por dentro das vísceras
do tempo a se engolir por si
atravessa minha carne
em perguntas sóbrias e só
eu indo sentindo tudo ainda e torto
sem gemer ou gritar
querendo não tentar partir
tentando não querer ficar.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

bic ho #5

puta que pariu.
boceta que chupou ou senão o coração que se lhe partiu
um tipo do sujeito que não dormesticado em sua cama
ou foi o gemido que lhe zuniu?
na cozinha , a gente trepa apoiado na pia
e toda faca que corta tem dois gumes
amor de fica é o que pica

diz o bom ditado

mais vale um na mão

que dois trepando

mais que um fato, um ato

um ditongo, outro de tanga

um de trouxa, outro de taxo

quem não mama em cima, certamente não mamará embaixo

pra mamar tem que chorar

pra chorar tem que doer

pra doer tem que acabar

pra acabar tem que bater

pra bater tem que olhar

(o olho é uma chaga, o olho em sua chaga)

toma vitamina pra sonhar com a menina

limpa geladeira pra guardar os trem da feira

passa hidrante pra virar um bom pedante

para de ter medo

e meter medo

(pra meter tem que molhar

pra molhar tem que lamber

pra lamber tem que suar)

não sei se vale uma gota

gota vã divã afã

gota pérfida

de amor amor amor amor amor amor

gota viva

esgota

esgoto

mais cospe que engole

esgotada

mais engasga que degusta

as coisas mais belas e porém as mais putas

das pautas e linhas escritas pelo deus que só enxerga

torto por linhas certas

são tortas as linhas

são tortas de galinha

servidas na mesa da cozinha onde a gente também usava trepar de noite

são certas as linhas

certas são as galinhas

servidas na mesa da cozinha onde a gente também trepava o uso de noite

mas sem cortes (nem reis nem rainhas)

mas com cortes

de dois gumes decepando vaga lumes

vagando rasgando vencendo

o fundo escuro do mundo com a bunda

e que as luzes do meu domicilio, não me deixam ver

e que as luzes do meu domicílio não me deixam meter

ou era só a minha sombra, ou era minha sombra só

ou era o nada

minhas mãos segurando o nada

ou o nada segurando minhas mãos

transgredindo mais que chão pra me estender

rasgando mais que céu pra deixar de entender

e aqui vou eu, abaixo sem pára-quedas

pra cima sem propulsão, com gravidade infinita

caindo sem vontade, com a cara mais bonita.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

já fiquei por ali mesmo. acho até que eu fazia cara de quem não ia sair.
pensei em acender um cigarro pra estabelecer essa idéia - de ficar mesmo.
era quase incomum que não tivesse nada pra tirar às pressas antes de deitar.
a cama tava vazia, acho que eu tava vazia.
tinha feito aniversário, de novo, afinal.
mesmo sem ter a sensação cortante de estar envelhecendo, bateu uma tristeza mesquinha, dessas que têm cor de desmaio, sabe?
por fim resolvi pegar o cigarro. não era nem meu.
tava com essa sensação meio que engasgada - que nada era meu ultimamente.
e ainda era o último. agora que já o tenho em mãos, sei que vai fazer falta mais tarde.
cigarro é coisa que quando acaba, deixa a gente assim, querendo mais do que quereria se tivesse. desconfio que quase tudo...
tomei remédio. pra curar o enjôo de mundo que eu tava sentindo. rezei baixinho pra dar sono.
lembrei de rezar pra minha vózinha, acho que ela tá com medo criado de morrer.
coisas essas que fazem tudo parecer pequeno. tipo coração partido, que nem o meu.
acho que eu tenho medo de morrer não, meu lugar no mundo é diminuto. o da vózinha é grande.
ela sabe mais que eu.
pelo menos de português, porque ela dava aula.
até ganhei, porque eu pedi pra não roubar, um dicionário desses grandões de capa dura azul, escrito aurélio de letras douradas e garrafais. mais de duas mil páginas de palavras.
nessas horas que a gente vê que entende nada.
nem a dor da vózinha, nem a minha... que é diferente.
aí o cigarro tinha acabado.
comecei a pensar outras coisas, até suspirei sem querer.
fiquei imaginando que eu era um barquinho. inventei até que eu era bicho, mesmo que isso eu fosse.
queria ser nada. coisa sem jeito, essa. sempre a gente é alguma coisa, mesmo que não se saiba precisamente, mesmo que seja coisa nenhuma.
até me incomoda um pouco essa idéia de vazio que as pessoas têm do vazio em si.
nunca acreditei que não ser não fosse. não ter não tivesse, etc...
continuava. porque tinha também.
por isso punha a idéia de barquinho em algum lugar bonito pra deixar correr.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

sair pra comprar cigarros era coisa de dez minutos. fazia cheiro de centro em tudo, e eu tentando concluir entre um passo e outro se era vazio ou tristeza cá dentro.
marchei de volta pra casa assim, meio engasgado, ainda sem adivinhar ao certo... não chorei por falta de coragem, mesmo que você nao estivesse p'ra assistir, bateu uma vergonha também.
não era nada assim muito surpreendente que fosse doente ou fúnebre querer consertar o que a gente despedaçou nesse tempo tão curtinho...
e mais ainda a cabisbaixice de te querer mesmo com todos aqueles silêncios, porque eu só queria. (isso é que dava vergonha).
mas também tinha que eu não conseguia mais.
chorar, digo.
e mesmo a certeza dura de que de repente eu era mais desgosto do que cabia a pele, dava vontade de ter um choro também.
eu era muito pequeno pra isso.
era coisa maior pelo menos, tratar-se de mim de vez em quando, quase um atestado de que eu ainda tentava, mesmo que sem querer.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

para o outro

entortei meu coração de vontade de saber como ele ficava assim.
se mais bonito ou colorido, ou só penoso mesmo.
sabia me doer, toda a hora, inventar que cor teria se a gente se desse em nós. que cor teria a meia luz de quando a gente fizesse amor se dizendo baixinho.
sabendo que ainda se você quisesse se adivinhar um padre, eu levaria flores e maçãs, pra me confessar um pouco também em mentiras, só pra ver se te cresciam ciúmes...
há de haver qualquer coisa de incomensurável em querer enternecer o mundo.
não sei ainda. acho mesmo irrelevante - disfarço pra não sentir o peso de seguir sendo aquela de traquéia, vazia, sabe? aquele aperto de quem não está faz tempo... é que de repente eu carrego mais do que um feto. vejo, por frestas que gritam, todo o medo vagando arredio por algum trecho escuro entre meu estômago e a minha alma. criando manchas. pegando apego mesmo. traçando pontes entre o que nem deveria ser uma junção, de um jeito desastrado... até mesclando cores feias.
esconjurei! praguejei, malogrei. aquela vista opaca de quem vê o nada com as mandíbulas impedidas. faz-se indevido cílio sequer e o corpo desaba. feito marionete sem dono. desmonta dengoso. deixo os dentes cerrados por prudência.
segura, vida. mais que forte.
fé que o santo deve mesmo ter algum poder de cuidar desses bichos: eu. e a possibilidade.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

bic ho #4

expostas nessas veias feverinas
arde a ferida inerte rasgando
a pele de um calango
de outras secas -
malogrando em direção
ao nada
passeia como se soubesse
de cada trinca do peito,
e abandona de si
aqueles lenços brancos
das partidas...
não disfarça o suor que a dor
absorve,
nem enxuga as passadas que esquece
na pele da terra...
anda torto
bravo
descompassado e turvo,
caminha bruno,
mais uma vez,
dá a cara a tapa
coração a faca...
tem medo,
mas sem outro meio
de escapar,
não tem saída.
sofrer é seu lugar de bicho
no mundo.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

bic ho #3

em algum lugar do mundo
jaz um corpo moribundo
bicho morto, bicho imundo
bicho aberto,
em algum lugar deserto
peito feto,
filho feio de janeiro
e dezembro.
em algum lugar por perto...
ébrio
sóbrio
vivo
rompido em seu inteiro
rasga outros gestos
cheira outros meios
em algum lugar tão fundo...
bicho solto,
fala torto
come medos...
come tudo,
animal ruminante
deselegante
salivante,
fadado à morte
rompante...
bicho malogrado...
bicho invisível...
bicho nada
se arrasta, romeiro
fadiga cruenta
sem pressa
fareja feito cão sarnento
a vida arrogante
apagado, esquecido, extinto
aclamado pelo silêncio
o bicho -
se curva abatido
e demente.
março já vem, animalzinho.
e ele peregrina,
seco.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

bic ho #2

se faz de oca
essa coisa
que mastigo
quase que
um castigo vazio...
quase que
um motivo transparente.
há qualquer esperança
(urgente) sendo sincera
nessa carne
covarde

disfarço maltratando o tempo.

não quero ver crescer em mim
algum amargo
nem me vestir de casulos brandos
e revoltos por condescendência
ou me entregar apático à apatia

se mesclo tudo
nesse pedaço de pele
não quero ser pequeno!
não posso
ser obtuso!

me apeguei enfim
a uma impressão substanciosa
e nata
que engole tudo
envolta de atração e nojo

opaco, estou cansado,
desboto qualquer galgar
que me faria colorir
o tédio de viver e nada

e de onde concluir
algum desejo?
se despejei n'alguma coisa
feita de folha ou de gente?
e rasguei abismos previstos
com o peito despido de medo?
com um absurdo ladrado?

arrasto essa sede de mundo
(tempo, estou cansado)
quase no escuro,
há uma senóide de palavras
que miam
e eu, bicho qualquer
adivinhando portantos capciosos - em partes.

sou todas coisicas viris...
de coração e medo.

e de repente tudo não me basta.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

mundo
esse comboio que invento
quase surdo
quase mudo
quase tenro
leva tudo que há de obsceno
tudo que há de trêmulo
deixa o que há em mim
e os raimundos e pedros
e doras
continuam perdidos
nas horas... do fim...
sigo rasgando palavras
colando, fazendo amarras
dos retalhos absortos
desse peito
que chamo meu,
ninguém vê,
ninguém ve,
minto,
como o mundo que não invento
mente
e se repete ao parir essas nuvens
sem cores da minha sacada
no centro da cidade coberta
de luzes de dezembro
e sombras de natal.
mais de meia noite
do dia vinte e quatro
de dezembro
cumpre seu destino
estremado
esse anel de zircone
validade eterna
(vendido por sandra, não bruna):
ganha meu dedo anelar.
não o polegar,
não o médio.
nem o mínimo.

sábado, 5 de dezembro de 2009

bic ho #1

quero ser triste
de novo
dormir feito morto
andar feito torto
comer feito porco
cair de repente
pagar de demente
fugir de motivos
plausíveis
rasgar cortesias
vagar prostrado
pelas salivas
das noites transgridas
não cumprir tarefas
aliviado
pelo pesar que corta
e não vence o gosto
(de debaixo da língua)
de me sentir doído,
e vivo.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

ai, tempo
faz de mim uma mulher de carne
e têmporas
de memórias palpitantes

faz de mim todas as dores
inventadas
desbotadas
que não cortam
nem arranham as entranhas
(e que não passam...)

faz:
velha minha pele dilatada
rugas em veias indolentes
e porquês vencidos com cantigas
de esquecer.

tempo, ai!
já deixei aberto o peito
pra você tecer a nostalgia...

inventa em mim um sentimento
de pedra galgada
faz de mim cor delicada

e ai, tempo
faz de mim
quase nada...

há em mim um lamento
urgindo ferrenho,
dizendo ignóbil...

quero ser um demente:
que basta, tempo!

uma pedra que fala
impune
e não sente
por consequência.